Você conhece o Sistema Laura? Essa é uma importante tecnologia de inteligência artificial brasileira, que ajuda a salvar centenas de vidas ao levar tecnologia de ponta, acessível e eficiente a hospitais brasileiros. Agora, com uma aliança entre o Instituto Laura Fressatto, o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (organização social vinculada ao Ministério), a iniciativa ganha consistência e coloca em prática a proposta de transformar socialmente o uso das tecnologias de saúde no mundo, ao levar a soluções tecnológicas de ponta para hospitais da rede pública de saúde. Conheça o projeto, os números que comprovam o impacto social e as narrativas de pessoas beneficiadas.
Quando o luto se transforma em luta
A tecnologia lançada para o mundo nasceu de uma história de amor dolorida. A começar pelo nome, que é uma homenagem e motor para impactar vidas positivamente. Em 2010, Laura, a primeira filha do arquiteto de sistemas Jacson Fressatto, nasceu. O início da vida da pequena foi uma prévia do tamanho da luta que travaria com bravura. Prematura e debilitada, ela lutou pela vida por 18 dias. Infelizmente, a menina entrou para as duras estatísticas da doença que mais mata no mundo, a sepse. Também conhecida como “envenenamento do sangue”, a enfermidade é responsável por uma em cada 5 mortes no planeta. Cerca de 11 milhões de pessoas morrem todos os anos pela doença silenciosa, que é difícil de ser detectada. Saiba mais sobre.
Mas essa história não acaba aí. Pelo contrário. Deu início a um novo capítulo. O pai da menina fez uma promessa: ninguém esqueceria o nome da filha. Então, Jacson se tornou um ativista e encarou a morte de Laura como uma “troca de interface”, para ajudar outras pessoas a terem histórias com desfechos diferentes da sua. Criou o primeiro robô cognitivo gerenciador de riscos do mundo, que não poderia ser batizado de outra forma. A iniciativa leva o nome de Laura, no propósito de identificar antecipadamente os riscos de deterioração clínica, como a Sepse. Veja:
Instalada em 32 instituições de saúde pelo país, o Sistema munido de inteligência artificial (IA) e tecnologia cognitiva é capaz de gerenciar dados da rotina hospitalar e emitir alertas para a equipe assistencial, o que melhora a capacidade preditiva, para que os pacientes mais críticos sejam atendidos com prioridade e recebam o tratamento adequado o quanto antes.
É importante ressaltar: o Sistema Laura não substitui o trabalho essencial de equipes médicas, mas fornece informações para que esses profissionais tomem decisões mais assertivas e possam salvar mais vidas, com o apoio da tecnologia.
Vidas impactadas pela tecnologia
As expressivas estatísticas de casos e mortes por sepse comprovam que não é incomum ver a história de Laura Fressatto se repetindo. A pequena Bianca Amaral, nasceu prematura, com apenas 27 semanas de gestação, por conta de uma infecção do útero da mãe, a jornalista Jéssica Amaral. Foram 77 dias difíceis, com muitas intercorrências, na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em um hospital de Curitiba (PR). Entre elas, uma hemorragia pulmonar e sepse tardia. “Esse foi um dos momentos mais dramáticos, com maior risco para ela. Eu lembro que naquela noite em que ela teve a hemorragia, os médicos não davam muitas esperanças…”, a mãe recorda.
No entanto, um fator decisivo tornou o desfecho positivo. No mesmo hospital em que Laura Fressatto tinha sido atendida, o Sistema de IA operava e deu suporte para a equipe médica. A mãe lembra de ver os profissionais olharem a todo momento para os monitores que comunicavam os dados do quadro, que evoluiu positivamente.
“Eu acredito que a tecnologia vem pra somar. Claro que o conhecimento da equipe médica é extremamente importante, mas a tecnologia é um grande apoio e pode simplificar processos demorados, que muitas vezes podem custar vidas. No caso da Bianca, foi muito importante para que riscos de infecções que podem levar a morte pudessem ser identificados, ainda mais com um bebe tão pequeno e frágil”, opina a curitibana. Logo, Bianca foi liberada da UTI e voltou para casa, onde cresceu saudável. Hoje, a menina tem dois anos de idade e vive com a mãe, em Curitiba.
Assim como Bianca, mais de 8,6 milhões de pacientes já foram atendidos e mais de 24 mil vidas já foram salvas com o apoio da tecnologia, desde que ela entrou em atividade. E a meta da organização social Instituto Laura é ambiciosa: impactar positivamente um bilhão de vidas, no Brasil e no mundo. “A promessa que eu fiz pra Laura de que ninguém ia esquecer o nome dela está se cumprindo quando o nome dela está à frente de muitos resultados significativos. As pessoas estão sendo salvas e nem sabem por que estão. Eu fico feliz com isso!”, comemora o idealizador Jacson Fressatto.
O propósito na prática
“O Sistema Laura existe com o objetivo de mudar a forma de pensar das pessoas em relação ao uso das tecnologias na saúde. A gente sabe que apesar da medicina ser totalmente relacionada a questões tecnológicas, há um fator crítico: nem todo mundo tem acesso a isso. Nosso objetivo é tornar essas tecnologias eficientes acessíveis. De nada adianta você ter uma “super” inteligência artificial, se ela é inacessível, custa milhões de reais e é objeto de grandes contratos comerciais, que beneficiará “meia dúzia” de pessoas no mercado. Tem que ser algo democratizado”, explica Jacson Fressatto.
Levar essa tecnologia de ponta para hospitais públicos, a fim de atender pessoas que precisam de atendimento otimizado, é exatamente o propósito da aliança entre Instituto Laura, RNP e MCTI. “Essa parceria está viabilizando o sonho de democratizar o uso de inteligência artificial para a população. O Brasil vai ser o primeiro país no mundo a ter inteligência artificial no sistema público de saúde, graças a essa aliança”, defende o arquiteto de sistemas.
Na primeira fase do projeto, a inteligência artificial está em implementação no Hospital das Forças Armadas (HFA), em Brasília. A expectativa é escalar a solução para outras unidades de saúde pelo Brasil. O que não falta são benefícios para pacientes e instituições com apoio da tecnologia:
Ao “entrar” em um hospital, a tecnologia opera analisando mais de 90 variáveis, das informações clínicas, como frequência cardíaca, respiratória e pressão, examinando resultados de exames de sangue e considerando fatores como dados demográficos, se o paciente tem alguma doença, qual a especialidade do hospital em que está internado e em que ala essa pessoa está internada. A cada três segundos, o robô faz uma nova análise de cada paciente. Se tiver algo errado, o robô emite alertas nas TVs instaladas nos portos de enfermagem e já indica uma possível causa.
Com os dados coletados, o Sistema elabora um índice de risco da deterioração clínica para cada paciente e analisa se aquele caso se assemelha a algum anterior em que a pessoa atendida foi a óbito. Os casos mais graves são priorizados. E a tecnologia só evolui: com machine learning (em tradução livre, aprendizado de máquinas) a inteligência artificial reconhece padrões e aprende conforme tem acesso a mais dados. Além disso, a tecnologia é automatizada para receber treinamento, de acordo com a orientação do hospital. Os médicos treinam os algoritmos para atender diversas enfermidades.
Foi o que aconteceu diante à pandemia da Covid-19. No HFA, por exemplo, a tecnologia foi habilitada para atender pacientes infectados que dão entrada na unidade desde que foi implementada, em março deste ano. Além do acompanhamento na área de internação do hospital, uma solução de Pronto Atendimento Digital do Laura coloca um chat-bot a serviço de pessoas que tenham dúvidas sobre o novo coronavírus ou queiram conferir se estão com sintomas característicos da doença, sem sair de casa.
Em uma triagem inicial online, é possível “conversar” com o robô, que orienta, se é o caso de buscar ou não atendimento em um hospital. A ferramenta tecnológica ainda indica unidades de saúde aptas a atender aquele paciente e notifica os hospitais de que um caso suspeito está chegando. A solução ajuda a evitar aglomerações e, consequentemente, diminui o contágio em idas desnecessárias ao pronto atendimento. Converse com a Laura no site no HFA. Veja como a funcionalidade opera:
No blog Day One, da transnacional de tecnologia Amazon a solução de PA Digital foi um destaque entre as soluções tecnológicas mapeadas durante a pandemia. Também internacionalmente, a atuação da tecnologia foi reconhecida por especialistas em inteligência artificial das renomadas universidades Harvard, Duke e Johns Hopkins.
É importante ressaltar: A tecnologia cumpre as determinações de segurança de dados pessoais dos pacientes, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). O Robô não retém nenhuma informação da base de dados dos hospitais em que está instalada. As informações permitidas à IA são lidas, trazidas para a base de dados do Sistema Laura para processamento de forma codificada e devolvidas com anonimidade. Ou seja, dados como nome completo, nome dos pais, RG ou CPF do paciente não são coletados.
De acordo com o arquiteto de sistemas e idealizador da solução, Jacson Fressatto, a parceira com RNP e MCTI torna os objetivos mais consistentes. “Esse é um ‘braço’ importante no governo, que busca validar e implementar as tecnologias. Nessa gestão especificamente, percebo que estão olhando muito para tecnologias imediatamente aplicáveis. Não é o que está em construção, mas o que já está pronto e já em uso. Se a gente não agir, nunca vamos conseguir democratizar e alcançar o maior número de pessoas. E, com essa aliança valiosa, vamos conseguir abraçar uma gama muito maior de hospitais e pessoas no país todo”, explica.
“Cada vida salva a partir das análises preditivas realizadas pelo Sistema Laura fortalece a dedicação de todos os profissionais que desenvolvem e trabalham para que soluções como essa sejam levadas para a maior quantidade de hospitais. A população poderá contar com tecnologia de ponta, nacional, à disposição do sistema público de saúde”, indica o diretor-adjunto de Soluções da RNP, Antônio Carlos Fernandes Nunes.
Segundo o ministro de CTI Marcos Pontes, a iniciativa está alinhada com a missão do Ministério de produzir conhecimento e riquezas para o Brasil, além de contribuir para a qualidade de vida dos brasileiros. “Esse projeto está exatamente dentro dessa ideia. É o uso da inteligência artificial de forma muito social, no dia a dia da gente. E é bom ressaltar que isso está sendo oferecido de forma gratuita nos hospitais. Isso é extremamente importante, essa percepção de como a ciência e a tecnologia podem ajudar a salvar vidas”, defendeu o astronauta.