A computação quântica não é mais promessa distante, mas uma realidade em construção. Esse foi o tom do primeiro encontro do Ciclo de Webinars “Tecnologias Quânticas na Saúde”, realizado no dia 5 de setembro. Promovido pela Rede Universitária de Telemedicina (RUTE/RNP), com apoio da RedCLARA, do Hospital Israelita Albert Einstein e da Universidade Federal do ABC (UFABC), o encontro reuniu especialistas destas instituições, que discutiram o potencial transformador da computação quântica para o setor de saúde e alertaram para a urgência de investimentos.
Segundo o especialista de Saúde Digital da RNP, Paulo Lopes, pensar em computação quântica aplicada à saúde já não é um tema do futuro, mas uma necessidade imediata: “O que nós estamos falando agora não é de futuro, é hoje”. O cientista de Computação Quântica Felipe Fernandes Fanchini, do Einstein, reforçou a mensagem: “É urgente que Brasil, sul global e todo o planeta olhem para a computação quântica para aprimorar métodos, diagnósticos e tratamentos em saúde”.
Da teoria à prática: fundamentos e aplicações
O evento apresentou conceitos básicos para o público, diferenciando o “mundo clássico” do “mundo quântico”, com destaque para a importância dos qubits e das propriedades de superposição e emaranhamento, que tornam possível acelerar cálculos impossíveis para computadores convencionais.
Foram discutidos algoritmos de primeira geração, como os de Peter Shor (algoritmo de fatoração) e Lov Grover (algoritimo de busca), e os de segunda geração, os variacionais, que combinam processamento clássico e quântico. As aplicações potenciais incluem desde a descoberta de novos medicamentos e otimização de radioterapias até análises genômicas, segmentação de imagens médicas e uso de inteligência artificial quântica para prever arritmias ou infartos.
Um exemplo recente citado por Fanchini mostrou que, já em agosto deste ano, experimentos em computadores quânticos analógicos indicaram vantagens no processamento de dados relacionados à toxicidade molecular e complicações cardíacas.
Investimentos e desafios para o Brasil
Os palestrantes destacaram o cenário de investimento global: a China lidera com US$ 15 bilhões, seguida dos EUA com US$ 7 bilhões, enquanto o Brasil investiu até agora cerca de US$ 16 milhões. Para Fanchini, a computação quântica é uma questão estratégica de soberania nacional: “Ela vai dar uma vantagem muito grande para aqueles que dominarem primeiro”.
No país, há avanços na formação de recursos humanos e em publicações científicas, mas ainda são raras as aplicações em saúde. A falta de infraestrutura impulsiona a chamada “fuga de cérebros”. Iniciativas recentes, como o INCT em Computação Quântica Aplicada e o edital da RNP que criou um cluster de computação quântica e segurança da informação, mostram avanços, mas o caminho ainda é longo.
Caminhos para a implementação
O físico e doutor em Ciência da Computação da UNESP, Felipe Melo Mahlow, apresentou a perspectiva prática de acesso à tecnologia, hoje viabilizada em grande parte pela nuvem, em plataformas de empresas como IBM, Google, Microsoft e Amazon. Ele destacou a aplicabilidade já possível de ferramentas como as Quantum GANs (QGANs), que geram dados sintéticos para suprir a escassez de dados médicos reais.
Para o Dr. Edson Amaro, superintendente do Einstein, a construção de um ecossistema de computação quântica voltado à saúde deve priorizar problemas sociais e a equidade. Ele ressaltou a necessidade de integração entre médicos, matemáticos e físicos, além da capacitação de profissionais de saúde para o uso responsável da tecnologia.
O Brasil conta com uma base sólida de pesquisadores, mas precisa avançar em infraestrutura, políticas de fomento e aplicações práticas em saúde. O engajamento de instituições e a formação de parcerias interdisciplinares são passos essenciais para que o país participe ativamente dessa revolução tecnológica e evite riscos de exclusão em uma área estratégica para a ciência e a sociedade.
O próximo webinar do ciclo será realizado no dia 3 de outubro e terá o tema “Computação Quântica na Saúde: aplicações reais e caminhos tecnológicos”. Confira a programação completa.
Assista à transmissão do webinar: