Keynote destacou a importância da educação para uma relação mais saudável com a inteligência artificial
“Para além de questões morais e políticas, há um problema ontológico deflagrado pela ubiquidade das novas tecnologias. Nós estamos mudando a nossa forma de perceber o tempo, o espaço, o mundo, as relações de causa e efeito”. Foi com essa reflexão que o professor Edgar Lyra Netto, diretor do Departamento de Filosofia da PUC-Rio, iniciou a sessão especial de encerramento do Fórum RNP 2023. Lyra Netto levou o público a um passeio filosófico sobre o poder de condicionamento que novas ferramentas tecnológicas, especialmente as que se utilizam de inteligência artificial, exercem sobre nossa existência.
O keynote speaker destacou que esse fenômeno não é novo, tendo ficado apenas mais evidente com a popularização de aplicações de inteligência artificial generativa, como o Chat GPT, desde o final de 2022. Conforme definiu Lyra, essa ferramenta que tanto se difundiu nos últimos meses, seria apenas a “ponta do iceberg” digital.
Dentre os muitos efeitos desse arcabouço tecnológico diário, o professor destacou a aceleração dos cotidianos. “O ritmo acelerado de vida não pode ser pensado como um mero acaso desse desenvolvimento [tecnológico] todo. Talvez nós devêssemos pensar um conceito de eficiência que não estivesse tão atrelado ao conceito de velocidade”, sugeriu Lyra Netto.
E qual seria então a melhor forma de se relacionar com essas tecnologias? A palavra-chave é regulação, entendida pelo professor como uma tríade formada por controle técnico de excelência, legislação nacional e transnacional adequada e educação, em seu sentido mais amplo.
“Precisamos formar mais do que meros usuários de tecnologia”
Em relação ao controle técnico, Lyra Netto enxerga um papel importante da RNP, como uma instituição capaz de pensar e ajudar a executar um projeto de Brasil no qual o desenvolvimento tecnológico jogue a favor de uma sociedade mais equânime e voltada para o bem-estar social.
Sobre a legislação, o filósofo a define como “absolutamente necessária” na construção de um ethos digital equilibrado – mas deixa claro: ela sozinha não basta. Novas leis que definam limites para tecnologias têm de estar ancoradas, antes de tudo, no terceiro e mais importante ponto: a educação.
Esta ocupa, de fato, um lugar de destaque no pensamento de Lyra Netto. Pelo lado do ensino e da pesquisa de nível superior, o filósofo ressaltou a necessidade de os acadêmicos colocarem em questão sua própria relação com a tecnologia e refletirem sobre as modificações atuais na produção do conhecimento.
Mas é na educação básica que o filósofo vê a chave para uma relação mais saudável com a tecnologia. Para Lyra Netto, é perigoso acreditar que basta ensinar crianças a operarem o que há de mais recente e relevante no cenário tecnológico. “Precisamos formar mais do que meros usuários de tecnologia. Precisamos conversar com os jovens para que eles aprendam a estranhar, a não serem passivos, a não simplesmente dançar conforme a música”, concluiu.