Evento em escola pública de Uberaba (MG) marcou última entrega de fase piloto em nove municípios; programa que democratiza acesso à internet vai ganhar escala em 2024
Maria Eduarda, 10, quer usar a internet para pesquisar sobre animais e plantas. Vitória, 13, vai ver vídeos e tirar dúvidas de matemática e geografia. Eduardo, 10, pretende descobrir novos jogos e ter apoio nas tarefas. Emilly, 14, deseja pesquisar vídeos de arquitetura e administração, potenciais profissões no futuro, além de manter contato com amigos e família.
Esses alunos são da Escola Municipal Anísio Teixeira, em Uberaba (MG), uma das 11 contempladas pela entrega de 1.726 chips de internet banda larga móvel no fim de novembro. A ação faz parte do programa Internet Brasil, iniciativa do Ministério das Comunicações (MCom) com apoio do Ministério da Educação (MEC) que prevê ampliar a conectividade para 700 mil estudantes de escolas públicas inscritos no CadÚnico (cadastro único para programas sociais do governo federal).
Executado pela RNP (Rede Nacional de Ensino e Pesquisa), o Internet Brasil concluiu, em Uberaba, a entrega dos 10 mil chips previstos na Prova de Conceito. Essa etapa funciona com um piloto de todo o programa. Ao todo, nove municípios participaram dessa fase, iniciada no fim de 2022. Agora, o programa entrará numa nova fase a partir de 2024 – com previsão de 50 mil novos chips a serem distribuídos no início do próximo ano letivo.
O marco foi celebrado em evento na quinta-feira (30 de novembro), com a presença de pais e alunos no auditório da Anísio Teixeira. Nas paredes, estudantes colocaram balões e cartazes com frases refletindo as expectativas geradas a partir da possibilidade de acesso à internet, como “Educação e tecnologia na construção dos saberes”.
Para Pedro Lucas Araújo, diretor do Departamento de Investimento e Inovação da Secretaria de Telecomunicações do MCom, os resultados da fase inicial de distribuição dos chips garantem a expansão do programa.
“Nossa intenção é crescer rápido, e tínhamos que ter certeza de que conseguiríamos entregar muitos chips com velocidade”, explica. “O evento em Uberaba é o último teste de distribuição massiva e conclui a etapa de Prova de Conceito, projeto-piloto do programa. Isso significa que agora temos os insumos, a informação e a experiência necessária para a ampliar o Internet Brasil a partir do ano que vem”, comemora.
Ele define a participação da RNP como fundamental neste processo. “A RNP juntava duas condições: já tinha experiência em campo com distribuição de chips, mas para alunos do ensino superior. Outro ponto é que estamos usando as escolas como canais de distribuição. E a RNP também já tinha experiência com secretarias de educação no contexto de ações conectividade de escolas ”
Como funciona o Internet Brasil?
O programa prevê que os estudantes tenham acesso, de forma gratuita, a um chip com até 20 GB mensais em dados móveis de internet. Outro diferencial é o uso de chips neutros, o que possibilita à RNP definir remotamente a operadora a ser usada. Dessa forma, o programa não fica dependente de uma empresa contratada (e, por consequência, do seu chip), podendo se conectar à rede 4G mais adequada em cada região.
Suely Campos, coordenadora de Soluções da RNP, diz que o modelo permite acessar a melhor conexão de internet para os alunos beneficiados. “Dada a dificuldade de obter o melhor sinal de conectividade com uma determinada operadora, é possível trocar sem descartar o chip plástico atual.”
Para ela, os resultados atuais confirmam que a expansão é viável. “O próximo passo será iniciar o atendimento para as demais secretarias de educação que devem participar do programa, além de ampliar o Internet Brasil para atender ao público-alvo de agentes comunitários de saúde e de combate às endemias”, diz.
O objetivo é ampliar a inclusão digital no país
Não por acaso, entre os alunos beneficiados, muitos terão internet disponível no dia a dia pela primeira vez, e outros vão poder ampliar o acesso.
“Ter essa internet grátis facilita bastante, pois não temos condições de pagar todo mês. Estou desempregada e tenho internet bastante limitada”, afirma Veridiane Alves de Paula, 35, mãe de Lucas Gabriel, 12, beneficiado pelo programa. “Isso vai me ajudar a estudar”, diz ele, enquanto mostra o folheto do Internet Brasil.
Francisco, 12, esperava pelo chip ao lado da mãe, Sandra Costa, 48. “Já tive um trabalho em que eu tinha de pesquisar e ficou difícil”, conta o menino. “Ele gosta muito de matemática e ciências, e é muito curioso para aprender. Hoje temos internet, mas é muito pouca.”
Assim que receberam o chip, as gêmeas Eloá e Tainá, 11, correram para compartilhar a novidade com as colegas. “Foi uma surpresa muito grande”, disse Eloá. “Com o chip, vai ser muito mais fácil para a gente estudar”, completou a irmã. As duas elencam português e matemática como as matérias preferidas – e também as mais desafiadoras.
Para Ketally, 11, aluna do 5º ano, o chip vai facilitar as tarefas. Ela conta que, em vários momentos, já precisou pedir ao irmão mais velho para imprimir atividades extras que a professora passa via internet. “Agora posso simplesmente apertar no link e fazer”, comemora ela, que também quer usar a ferramenta como apoio para buscar imagens para desenhar e no contato com a família.
Diretora prevê maior contato com famílias e organiza monitoria tecnológica
Segundo a diretora Edna Chimango, atualmente todas as salas de aula já têm grupos de Whatsapp. “Às vezes, o único contato com as famílias é pela internet, porque muitos não têm créditos para ligações. O chip vai permitir maior contato, fora a ampliação na aprendizagem”, afirma ela, que vê outras dificuldades a serem superadas.
“Nossos alunos vêm de uma realidade muito vulnerável. Recebendo esses chips e tendo oportunidade de acesso, há uma ampliação do conhecimento”, completa a vice-diretora e professora Camilla Bosco.
O controle do acesso à internet deve ser feito pelos pais, que assinam um termo de responsabilidade e autorização para entrega do chip pelas escolas. A escola, porém, participa desse processo como ponto de apoio – daí a interface com as unidades de ensino. É o caso da Anísio Teixeira, que já planeja palestras sobre segurança na internet para os beneficiados pela entrega dos chips. “Em fevereiro, queremos fazer uma monitoria tecnológica. Vamos treinar dois a três alunos em cada sala para dar esse apoio”, conta a diretora.
O aparelho celular deve ser disponibilizado pelas famílias. A medida segue pesquisas que apontam que boa parte da população já tem acesso aos aparelhos, mas com dificuldade no acesso amplo à internet. “Entregamos o chip para o aluno, mas o propósito é que ele seja o vetor de inclusão digital da família”, ressalta Pedro Lucas Araújo, do MCom.
O evento de distribuição foi marcado ainda por apresentações sobre cuidados na internet, leitura de poesias e interações com alunos. Alguns citaram sonhos para o futuro, como ser jogador de futebol, goleiro, advogado, atriz/ator e perito criminal.
*Crédito fotos: Alexandre Rezende