Quem serão os espectadores e como será a jornada na TV 3.0?

- 16/07/2024

Presente em 94,4% dos domicílios brasileiros (71,5 milhões deles), de acordo com o módulo de Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC) da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) realizada em 2022, a TV é muito mais do que um mero eletrodoméstico por aqui. Algumas pessoas a consideram um “membro da família”, justamente por estar onipresente em suas vidas desde a chegada ao país em 18 de setembro de 1950.

Quase 74 anos e várias evoluções depois, a TV, antes soberana, vive atualmente um contexto de disputa pela atenção dos espectadores com os diversos dispositivos advindos do surgimento da internet, principalmente os smartphones. E é justamente dentro desse panorama que ela passará por sua maior transformação no Brasil.

Incentivado pelo Ministério das Comunicações (MCom) em parceria com o Fórum do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (Fórum SBTVD) e com apoio da RNP, o projeto de criação da nova geração televisiva no país, a TV 3.0, está na Fase 3 e tem a implementação prevista para 2025. E não será uma simples evolução tecnológica, as mudanças vão revolucionar a relação dos brasileiros com a TV aberta, promovendo mais interação e dando quase que 100% de autonomia aos espectadores.

TV orientada a aplicativos 

A pesquisa da jornada do telespectador da TV 3.0, orientada a aplicativos, vem investigando desde as configurações iniciais relevantes em um ambiente smart TV fictício à navegação pelo conteúdo da televisão aberta, sob um paradigma que tem potencial para ocultar a abstração de canais e sua numeração, para promover um total controle de conteúdos e experiências por meio de aplicativos dos radiodifusores. 

Os insumos atuais são um resultado parcial de um ciclo recorrente de desenho de interface, desenvolvimento, refinamentos e extensões, aplicando técnicas de design thinking e de computação centrada no usuário. O protótipo está sendo desenvolvido em HTML5 para execução em hardware Raspberry Pi 4 model B com controle remoto universal.

O modelo vem sendo usado em grupos focais, pesquisa de opinião e eventos de demonstração para promover o debate, a validação e a publicização, mais detalhadamente visando: o melhor entendimento possível sobre o novo paradigma; a validação e o refinamento dos novos conceitos junto a telespectadores comuns e a especialistas da área; a avaliação do desempenho de uma implementação do paradigma em hardware com recursos limitados; a identificação de pontos de fricção e de possibilidades de harmonização entre os ambientes smart TV e TV 3.0; a identificação de novos requisitos e desdobramentos decorrentes dos requisitos originais AP-6.x do Call for Proposals TV 3.0; identificação de metadados necessários, além de outros objetivos. Importante ressaltar que não é objetivo desta prototipação buscar padronização no design das interfaces gráficas. 


Aplicativo de programação segmentada

Durante as pesquisas para o desenvolvimento da TV 3.0, foi debatido o caso de uso do aplicativo de programação segmentada, que propõe uma abordagem para a difusão de conteúdo (publicitário) utilizando os ambientes de distribuição OTA (Over The Air – pelo ar) e OTT (Over The Top – sobre a rede de internet) de forma imperceptível ao usuário. O foco foi discutir a identificação da localização de um receptor/telespectador, demonstrar a apresentação de propaganda segmentada (direcionada), visando a execução em hardwares simples, como o Raspberry Pi 4 model B, o protótipo está sendo implementado utilizando HTML5 e JavaScript e também NCL.

O debate envolveu:

1. Exemplo de aplicativo de uma emissora seguindo o modelo demonstrado e definido pela equipe de P&D, com:

  • Verificação de permissões: aplicação verifica se o usuário permitiu o acesso aos dados de localização.

  • Transmissão do Conteúdo Principal: Início da transmissão, onde um conteúdo de uma emissora é apresentado.

  • API de localização: a aplicação usa a API de localização para obter a propriedade de localização do receptor e usá-la para resolver qual propaganda deve ser apresentada

  • Decisão de Conteúdo Publicitário: baseado na permissão de localização, a aplicação determina se a próxima propaganda a ser exibida será geral ou local.

  • Exibição de Propaganda: Conforme a decisão, a propaganda local ou geral é transmitida, seguida pelo retorno ao conteúdo principal.

Acessibilidade multidispositivos 

Um sistema de exibição de acessibilidade e alertas de emergência foi desenvolvido, simulando o ambiente da TV 3.0. Os recursos de acessibilidade são: legendas (captions), audiodescrição, aprimoramento de diálogo e língua de sinais. Estes podem ser exibidos tanto na TV quanto em dispositivos móveis e também podem ser customizados de acordo com o usuário. Os alertas de emergência são apresentados diretamente na TV, em modo texto, áudio e também em língua de sinais, transmitidos a partir de uma aplicação que simula o envio de uma estação de TV.

Cocriação em foco

Antecipando essas transformações, o GT de Codificação de Aplicações, um dos grupos envolvidos no projeto apoiados pela RNP, realizou um trabalho minucioso para pré-identificar quem serão os usuários da nova TV e como será a jornada desses espectadores a partir das possibilidades que serão oferecidas.

Os integrantes do GT, que são pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), além de colaboradores da RNP, se reuniram no Rio de Janeiro em agosto de 2023, para fazer esse mapeamento em dois encontros.

A metodologia ágil do design thinking permeou toda a programação e criou um ambiente propício para o debate e a colaboração. No primeiro dia, foi criado todo o contexto do desenvolvimento da nova tecnologia, com a delimitação do produto digital em nível conceitual e funcional, quando foram construídas as personas usuárias e preenchidos os mapas de empatia de cada uma delas.

“A aplicação da metodologia de design thinking foi fundamental não somente para garantir o nivelamento de entendimentos sobre o escopo do que seria a TV 3.0, mas também para promover empatia com os perfis identificados para o mapeamento de suas possíveis crenças, expectativas e receios em relação à nova tecnologia. Graças a esse olhar focado no usuário, pesquisadores de diferentes áreas puderam convergir suas discussões em artefatos visuais críveis, contribuindo para que o GT pudesse se beneficiar de um desenho de cenário o mais realista possível às necessidades e contextos de uso dos potenciais telespectadores”, afirma a consultora de design thinking da RNP responsável por facilitar o workshop, Lisandra Pereira.

A cocriação entre os pesquisadores, divididos em grupos, resultou em quatro perfis de espectadores da TV 3.0:

  • A espectadora da terceira idade, que é mais resistente às mudanças, porque já é muito acostumada com a maneira de se relacionar com o eletrodoméstico e tem receio de não conseguir acompanhar as novas tecnologias.

  • O espectador adolescente que encara a TV como mais uma tela. Por não ter dificuldade para usar novas tecnologias, sua principal preocupação é com o conteúdo.

  • A espectadora criança que não tem poder de escolha nos canais abertos.

  • O jovem adulto portador de deficiência visual que considera a TV importante para se informar, se inserir socialmente e para entretenimento. Ele necessita, prioritariamente, de conteúdo e sistema acessíveis para que ganhe autonomia.

 

No segundo dia do workshop, foi a vez do GT desenhar as jornadas básicas das personas priorizadas. Nesta atividade, os grupos de pesquisadores, em conjunto, definiram as etapas, os atores, as ações e os pontos de contato de cada jornada, complementando-as com riscos e dores aos quais as personas estão expostas ao utilizarem a TV 3.0

“Esses encontros são muito importantes porque suscitam a discussão tendo diferentes pontos de vista em cima desse requisito importante para a TV 3.0 que é uma mudança de paradigma do que a gente conhece hoje como canais de TV e passará a ser tudo orientado a aplicativos. Montamos uma equipe bem heterogênea com computação, comunicação social e, agora, temos o suporte da RNP trazendo essa metodologia do design thinking, que faz a gente questionar se o caminho está correto e que dificuldades os usuários de TV vão ter com essa nova abordagem. Só assim vamos chegar em um resultado que tem maior chance possível de ser adotado e conseguir atender às necessidades dos diferentes perfis de telespectadores que temos. Esse tipo de discussão no processo de P&D é fundamental, conseguindo ir a fundo nos problemas reais que as pessoas vão ter ao encarar essa nova tecnologia e forma de ver TV”, avaliou o coordenador do GT de Codificação de Aplicações e professor da UFJF, Marcelo Moreno.

Resultados

A consequência deste trabalho, realizado em julho de 2023, foi a formulação de um grande conjunto de protótipos que foram apresentados a diferentes grupos focais – que foram recrutados considerando também as personas desenvolvidas na atividade de cocriação - permitindo uma avaliação da percepção dos telespectadores dessas mudanças e a confirmação das hipóteses levantadas.  Após diversas rodadas de construção, a equipe evoluiu para um protótipo também de design, incorporando as soluções de usabilidade testadas e que agora vem sendo demonstradas em eventos da TV Digital e que podem ser conferidas na galeria abaixo.

Outro ponto a destacar foi a oportunidade de utilizar o login único do governo federal, a identidade gov.br, como uma das formas de identificação dos telespectadores usuários do aparelho de televisão, de modo a permitir um melhor uso das tecnologias desenvolvidas também para apoiar a entrega das dezenas de serviços digitais disponíveis e com contexto.

Por fim, um último desdobramento dos trabalhos dos pesquisadores extra escopo do projeto foi a identificação da oportunidade de desenvolvimento de um aplicativo único para gerenciar os dados dos telespectadores que permitiria a configuração automática de novos aparelhos e a continuidade da utilização dos recursos de personalização em qualquer aparelho, inclusive em modo visitante, assim como com outros aplicativos em televisores conectados.

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